segunda-feira, 23 de setembro de 2013

David Ponter: A Ordem dos Decretos de John Cameron (1579-1625) e Moses Amyraut (1596-1664)



Aqui estão as linhas essenciais de John Cameron [sobre a Ordem dos Decretos]:

“Por conseguinte, há dois tipos de decretos, um deles requer uma condição, outro não. Aquele pode ser denominado condicional, e o segundo de absoluto. Sobre o primeiro tipo [de decreto] está sujeita a justificação, e assim esta requer, necessariamente, a fé e o arrependimento. Sobre o segundo tipo [de decreto] está ligada a vocação eficaz, e esta não necessita de condições e disposições... O primeiro decreto, então, é restaurar a imagem divina sobre a criatura, de uma forma que os direitos de justiça possam ser assegurados. O segundo é enviar o Filho de Deus ao mundo para salvar todo aquele que nele crer, isto é, [os que] são os seus membros. O terceiro é tornar os homens aptos e capazes de crer. O quarto é salvar aqueles que crerem. Os dois primeiros são gerais, os dois últimos especiais e particulares. Em nosso método de considerar as coisas, o principal está antes do menos principal. O geral é anterior ao especial e particular...Mas tudo isso é para ser entendido como falado de Deus, de uma forma acomodada à enfermidade da mente humana”.

[De acordo com ele], há basicamente dois tipos de decretos, um decreto condicional geral e um decreto absoluto limitado. Os dois primeiros decretos são condicionais, seguido por dois decretos absolutos. Para Cameron, Amyraut e Davenant, et al, estes decretos condicionais sempre foram agrupados na vontade revelada de Deus. Decretos condicionais nunca se referem a um a ineficaz vontade de decreto absoluta ou secreta. Por exemplo, veja Davenant sobre o significado de decretos condicionais aqui ou aqui (ambos em inglês) para ver mais exemplos e explicações.

Isso agora nos ajuda a compreender [a posição de] Amyraut [exposta pelo Sínodo de Alancon (1637)]: 

“21. E enquanto eles fizeram distinção nos Decretos no Conselho de Deus, o primeiro dos quais é o de salvar todos os homens por meio de Jesus Cristo, se eles crerem nele; o segundo conceder fé para algumas pessoas em particular; eles declararam que eles fizeram isso por nenhuma outra razão do que a de acomodá-los a essa Forma e Ordem, a qual o espírito do homem observa em seus raciocínios para o socorro de sua própria enfermidade; eles creem que, embora considerassem este Decreto como diverso, [ele] foi formado em Deus em um único e mesmo momento, sem qualquer sucessão de pensamento, ou ordem de prioridade e posterioridade”.

O primeiro decreto acima corresponde ao decreto condicional de Cameron, e o segundo ao seu decreto absoluto.

Então, onde é que isso nos leva? Isso nos leva ao fato de que esta "ordenação" não é de forma nenhuma comparável ao padrão infra ou supralapsariano de ordenação. Nestas duas o padrão de ordenação é de uma série de decretos absolutos, por exemplo: criar, permitir a queda, eleição, enviar o Filho ( para os eleitos), etc. Quando pessoas como Warfield justapõe o padrão infra ou supra de ordenação sobre e contra o de Cameron ou Amyraut, eles estão se engajando em uma simples falácia de categoria, comparando maçãs com laranjas, ou giz com queijo, como dizemos na Austrália.

Os dois tipos de ordenação não devem ser colocados lado a lado como se fossem ordenações unívocas com o mesmo conceito unívoco de decreto.

E, ainda, a ordem de Cameron-Amyraut é puramente estabelecida como percebido a partir do ponto de vista humano, o ordo historia . Nós "vemos" a criação , a queda e a obra pública de Cristo (incluindo "encarnação"), mas nós “vemos” eleição e salvação, como efetivamente decretada e aplicada aos crentes, após o fato. Mas tal "depois do fato" visto é "secundário" ao nosso ponto de partida que é a criação, a queda e a redenção, ou seja, a obra pública de Cristo.

Isto confirma um pensamento que tenho há muito tempo, que os detratores de Amyraut enquadraram sua linguagem assim para sugerir que haviam decretos absolutos, o que hoje chamamos de vontade decretiva, sendo condicionados pelas ações dos homens, ou seja, volições de decreto ineficazes. Mas não é isso que Cameron e Amyraut estavam dizendo.

Além disso, Warfield em seu gráfico sobre o plano da salvação está simplesmente errado na sua redação do segundo decreto como sendo "a dádiva de Cristo para tornar a salvação de todos os homens possível” [1]. Isso cheira a um decreto absoluto e absolutamente não espelha Cameron ou a versão de Amyraut.

Smeaton também é interessante:

“Quando examinamos a teoria minuciosamente, ela não permanece unida . Seus defensores falam de um decreto universal, em que Deus deveria ter dado a Cristo como um mediador para toda a raça humana, e de um decreto especial, no qual Deus, prevendo que ninguém creria em sua própria força, foi suposto ter eleito alguns para receber o dom da fé. Sem dúvida ele difere da posição arminiana nesse sentido: que a fé não foi atribuída ao livre-arbítrio do homem, mas supôs-se ser derivada da livre graça de Deus. A teoria reconheceu a eleição soberana de Deus, segundo a Sua boa vontade. Mas ela trabalhou sob o defeito de supor um duplo e conflitante decreto, ou seja, um decreto geral, em que foi dito querer a salvação de todos, e um decreto especial, em que foi dito querer a salvação do eleito. A Cristo também é atribuído um duplo e discordante objetivo, isto é, satisfazer por todos os homens, e satisfazer apenas pelos eleitos. Como um sistema de reconciliação, e um incoerente, que visa harmonizar as passagens da Escritura, que ao mesmo tempo parecem estender os méritos de Cristo para o mundo, e em outro limita-os à igreja; para não mencionar que Deus é considerado como se decepcionando em seu propósito”. [2]

Se os decretos são diferentes tipos de decretos, então não há conflito , a menos que queiramos afirmar, de forma a priori, que a vontade revelada contradiz a vontade secreta. E um decreto com base em pré-conhecimento? Isto sugere que mera presciência é operativa, como um tipo de conector sequencial, quando na verdade, Amyraut em sua Brief Tract nega expressamente tal idéia.

E assim, para Cameron e Amyraut, os dois primeiros são decretos legislativos condicionais revelados, o segundo é o que Deus livremente fará em si. O terceiro decreto não é logicamente dependente do decreto anterior, como por algum tipo de causalidade linear, lógica ou de outra forma, o que é o caso das ordenações infra ou supralapsarianas padrão.

E isto é confirmado pelo fato de que Davenant sabia de dois conjuntos de ordenações. Um que tem eleição antes da designação de Cristo para os eleitos, que se encaixa tanto no sistema infra ou supra padrão e a ordenação que tem a designação de Cristo para o mundo, e então a eleição, o que espelha a ordem Cameron-Amyraut .

Assim, a lição é que a chamada ordem amyraldiana dos decretos não é na verdade nem mesmo propriamente comparável à ordenação infra-supralapsariana padrão (da mesma forma que a ordenação infra pode ser comparada com a ordenação supra). Os Salmurianos estavam jogando um jogo completamente diferente aqui, da mesma forma que Cricket é diferente de Baseball.

Além disso, pode-se não concordar com a ordem cameron-amyraldiana e ainda ser um calvinista clássico-moderado e também sustentar uma ordenação infra- ou supralapsariana (por exemplo, Twisse), simplesmente porque os dois principais tipos de ordenação são distintos. Ou, teoricamente, você poderia até concordar com a ordem de Cameron-Amyraut e ainda também sustentar uma ordenação infra ou supralapsariana. 

Quando se o significado de decreto condicional de Cameron e Amyraut (ou de Davenant ), eu não penso que o conteúdo de sua ordenação seja problemático. Nem a própria ordem em si é problemática. Pessoalmente, eu prefiro a rejeitar todas as formas de ordenar a lógica redentora da mente divina. Na verdade, Cameron e Amyraut , por sua vez, procuraram explicitamente evitar todas as especulações sobre a ordem dos decretos absolutos de Deus na mente divina. Havia o objetivo de não se engajar nesse tipo de atividade especulativa .

No entanto, a chamada ordem amyraldiana parece bastante atraente, pois faz de seu ponto de partida a revelação de Cristo como o salvador designado para o mundo, o que nos direciona para o seu ofício público e à vontade revelada; enquanto que tanto no infra quanto no supralapsarianismo, volta-se aos decretos secretos como seu ponto de partida teológico e epistemológico (o que resultou em uma tragédia para os reformados na minha opinião).

Notas:

[1] BB Warfield, The Plan of Salvation, (Grand Rapids: Eerdmans, 1960), 31.
[2] George Smeaton, The Apostles’ doctrine of the atonement, (Grand Rapids: Zondervan, 1957), 541. [Italics mine.]

Fonte:  
http://calvinandcalvinism.com/?p=12886#more-12886

Sem comentários:

Enviar um comentário