quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Paul Hartog: Evidências para a Expiação Limitada em Calvino

Os materiais encontrados no capítulo anterior [12 Questões em Calvino sobre a Extensão da Expiação] não convenceram todos os intérpretes de João Calvino de que ele defendia uma forma de "redenção universal." 

Os estudiosos que retratam Calvino como um defensor da estrita “expiação limitada" acentuam três passagens do reformador em particular.¹

Primeiro, um texto que é mais comumente discutido pode ser encontrado na sua "Réplica a Heshusius" um luterano por Calvino em 1561.² A este respeito, Frederick Leahy (um proponente da "redenção limitada") afirma: "Estudantes de Calvino tem encontrado apenas algumas passagens que poderiam ser consideradas como negando explicitamente uma expiação ilimitada"³. Boersma destaca este mesmo texto como um exemplo inequívoco da estrita “expiação particular”.4

Em sua "Réplica a Heshusius", Calvino escreveu: 

"A primeira coisa a ser explicada é Como Cristo está presente com os incrédulos, para ser o alimento espiritual de suas almas, e, em resumo, a vida e a salvação do mundo. Como ele [Heshusius] adere tão obstinadamente às palavras, eu gostaria de saber como os ímpios podem comer a carne de Cristo que não não foi crucificado por eles e como eles podem beber o sangue que não foi derramado para expiar os seus pecados? "5

O contexto, no entanto, é a oposição de Calvino à visão luterana da real e corporal presença de Cristo nos elementos da Eucaristia, recebidos tanto por crentes e incrédulos.Rouwendal nota que 

"a intenção de Calvino foi deixar claro que Cristo não estava presente corporalmente. No contexto imediato da frase citada, ele usa o argumento de que se Cristo estava presente corporalmente, os ímpios comeriam sua carne e beberiam o seu sangue, o que Calvino considera impossível.” 7 

Heshusius adere "tão obstinadamente" a uma interpretação literal do pão e do vinho como corpo e sangue de Jesus. "Eu gostaria de saber", respondeu Calvino, como até mesmo os incrédulos poderiam participar da real
presença. 8 Calvino explica em outro lugar,

"Por isso a ceia é uma certa atestação, que é dirigida tanto ao ímpio como também ao bom, a fim de oferecer Cristo a todos indiscriminadamente; mas isso não quer dizer que todos o recebem quando Ele lhes é oferecido. E na verdade, seria demasiado absurdo afirmar que Jesus Cristo é recebido por aqueles que são estranhos a ele, e que o ímpio come seu corpo e bebe o seu sangue enquanto destituído de seu Espírito. . . . Sua ofensa, então, é que eles rejeitaram a Cristo quando ele estava presente para eles".9

Curt Daniel conclui: "O que Calvino está negando é  a interpretação literal desses versículos e que  o ímpio coma a Cristo. Ele não está negando que a carne de Cristo foi crucificada pelos ímpios." 10


Nesse contexto polêmico, Calvino enfatizou a recepção de Cristo somente pelo crente -na fé - e, portanto, retirou o seu argumento da eficaz aplicação da expiação para o crente.11 Somente alguns parágrafos antes, o próprio Calvino declarou que quando os ímpios na mesa do Senhor 

"impiedosamente rejeitam o que é oferecido livremente a eles, são merecidamente condenados por profano e desprezo brutal, na medida em que reputam como nada a vítima pela qual os pecados do mundo foram expiados, e os homens reconciliados com Deus." 12

Em outro lugar, a própria teologia de Calvino sobre a Ceia do Senhor ainda fala sobre a provisão universal do sacrifício de Cristo.13 Calvino interpretou as palavras de Jesus como afirmando

"O pão que Eu darei é a minha carne que darei pela vida do mundo. . . como a carne foi oferecido uma vez na cruz para a salvação do mundo". 14 

Calvino explicou: 

"Também quando nós ministramos a Ceia do Senhor, nós repetimos o que foi dito por nosso Senhor Jesus Cristo: “Este é o meu corpo que é entregue por vós”: “este é o meu sangue que é derramado para a salvação do mundo”. 15" Nós estamos ordenados a comer o corpo que foi crucificado por nós; em outras palavras, tornar-se participante do sacrifício pelo qual os pecados do mundo foram expiados." 16 "Ele se dirige aos discípulos pelo nome e incentiva os fiéis como indivíduos a aplicação do derramar do Seu sangue para seu benefício. Assim, quando chegamos à mesa sagrada , não só a idéia geral vem à nossa mente que o mundo é redimido pelo sangue de Cristo, mas também cada um deve considerar para si mesmo que seus próprios pecados estão cobertos."17 

Quando essa evidência é comparada com a "Réplica a Heshusius" torna-se claro que Calvino não negou uma dimensão universal para a extensão da expiação, mas se opôs a uma visão luterana da comunhão.

Como segunda evidência para uma estrita “expiação limitada” em Calvino, alguns estudiosos apontam seu comentário sobre 1 João 2:2. Por exemplo, Robert Peterson afirma que é "importante" o silêncio das Institutas sobre a questão da extensão da expiação. 18 "No entanto", acrescenta Peterson, "pode-se recorrer aos comentários de Calvino para defender a expiação limitada".19 Peterson, então, acrescenta uma nota de rodapé que cita o comentário de Calvino sobre 1 João 2:2 como um exemplo. Com relação a esse versículo ("E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos pecados de todo o mundo), Calvino escreveu:

"Ele colocou isso por amplificação, para que os crentes possam ser convencidos de que a expiação feita por Cristo se estende a todos que pela fé, abraçam o Evangelho. Mas aqui a questão pode ser levantada sobre como os pecados do mundo inteiro foram expiados. Eu passo sobre os sonhos dos fanáticos, que fazem disso um motivo para estender a salvação a todos e até mesmo para o próprio Satanás. Tal idéia monstruosa nem vale a pena refutar. Aqueles que querem evitar este absurdo tem dito que Cristo sofreu suficiente por todo o mundo, mas eficazmente apenas pelos eleitos. Esta solução tem prevalecido comumente nas escolas. Embora eu conceda a verdade disso, eu nego que se encaixa nessa passagem. Porque o propósito de João era apenas fazer a benção comum a toda Igreja. Portanto, sobre a palavra “todos” ele não inclui os réprobos, mas refere-se a todos os que crêem e a aqueles que foram espalhados por diversas regiões da terra. Pois, como é próprio, a graça de Cristo é realmente feita clara quando é declarada a ser a única salvação do mundo".20

Calvino entendeu o versículo como "a expiação feita por Cristo", que "se estende a todos os que pela fé, abraçam o Evangelho", e essas visões polêmicas foram colocadas por “universalistas” que “estendiam” a salvação “a todos os réprobos e até mesmo ao próprio Satanás."21  Calvino atacou esta mesma interpretação "universalista” de 1 João 2:2  no Concerning the Eternal Predestination of God.22   Georgius argumentou que, se Cristo expiou os pecados do mundo inteiro, então os réprobos seriam efetivamente salvos - ou a única outra opção é dizer os réprobos não fazem parte do mundo. A tática de Calvino era conceder que 1 João 2:2 dizia respeito à salvação eficaz, mas que ela se "estende" somente para toda a Igreja.

Aqui lembramos do comentário de Calvino sobre Romanos 5:18: "Paulo faz a graça comum a todos os homens, não porque, de fato, se estenda a todos, mas porque é oferecida a todos." Calvino vai então reconhecer que "Cristo sofreu pelos pecados de todo o mundo, e é oferecido pela bondade de Deus, sem distinção a todos os homens, embora nem todos o recebem". 23  

Nigel Westhead nota que "A coordenação e co-extensão da oferta e do sofrimento são claros nos comentários de Calvino em Romanos 5:18. . . . Cristo sofreu pelos pecados do mundo, e é oferecido pela bondade de Deus sem distinção a todos os homens. . . "24 No entanto, a graça não (eficazmente) "se estende" a todos. Em outro lugar Calvino reafirmou, "a virtude e os benefícios de Cristo são estendidos a, e pertencem a, ninguém a não ser os filhos de Deus " 25.

Tomando essa evidência de salvação "estendendo-se" eficazmente apenas aos eleitos de volta para o exame de 1 João 2, o ponto de Calvino não era negar que Cristo sofreu por todos e foi oferecido a todos, mas apenas que sua expiação não "se estende" eficazmente a todos, mas somente para "todos os que pela fé abraçam o Evangelho." 26 Calvino estava disposto a permitir que a máxima “clássica”, "Cristo sofreu o suficientemente por todo o mundo, mas eficientemente somente pelos eleitos" 26

No entanto, ele estava lutando contra oponentes que eram heréticos "universalistas" (que acreditavam que todos seriam salvos no fim), que liam propitiatio como reconciliação eficaz. Calvino concordou que 1 João 2:2 falava da obra eficaz de salvação, e estava (compreensivelmente) indisposto a aplicar essa obra eficaz para o réprobo e para o próprio Satanás. Ele, portanto, interpretou "o mundo inteiro", como "toda a Igreja". Nesta etapa, Calvino interpreta de forma paralela a interpretação de Agostinho.28  Além disso, Calvino tomou a oportunidade para enfatizar a exclusividade da salvação em Cristo: "Pois, como é próprio, a graça de Cristo é realmente feita clara quando é declarada ser a única salvação do mundo.”29

Neste comentário sobre 1 João 2:2, Calvino aprovou o princípio escolástico de que "Cristo sofreu suficientemente por todo o mundo, mas eficientemente somente pelos eleitos" como sendo verdadeiro.30  Mas ele não acredita que esta máxima era a chave interpretativa para 1 João 2:2. Dentro dessa polêmica Calvino concordou que o texto falava da efficientia da salvação. Mas ele replica que 1 João 2 descreve a expiação "eficiente" de Cristo por "toda a Igreja", incluindo os "dispersos por várias partes do mundo". Em tal interpretação, o texto se tornou irrelevante para a questão da “suficiência”. Calvino, portanto, rompe a companhia de modernos “calvinistas de quatro-pontos”, que interpretam 1 João 2:2 como uma provisão toda-suficiente da expiação por "todo o mundo". Por outro lado, em várias outras passagens, Calvino poderia falar da expiação dos pecados do mundo, sem qualquer adicional comentário ou explicação.31

Interessantemente a interpretação de Calvino do “mundo” em 1 João 2:2 conflita com sua abordagem do sentido do “mundo” em João 17:21 (“para que o mundo creia que tu me enviaste) Calvino comentou sobre este versículo: "Alguns explicam o “mundo” como os eleitos que estavam, ainda, dispersos. Mas uma vez que a palavra “mundo” por todo este capítulo se refere aos réprobos, estou mais inclinado a tomar uma visão diferente. Acontece que logo depois Ele separa o mesmo mundo que agora menciona de todo o Seu povo."32 

No contexto de João 17, Calvino acentuou o fato de que Cristo intercede apenas pelos discípulos, e não pelo mundo (João 17:9) .33 Na literatura joanina, o "mundo" está em oposição aos valores e ao povo de Deus. Em seus comentários sobre João 16:33, Calvino explica que “Sob o nome “mundo” Cristo aqui abrange tudo o que se opõe à salvação dos piedosos e especialmente toda as corrupções que Satanás usa para colocar armadilhas para nós." 34 Por último, deve ser observado que tanto Girolamo Zanchi e Jacob Kimedoncius defendiam uma leitura "limitada" de 1 João 2:2, e ainda assim eles são reconhecidos por Richard Muller como ensinando uma forma de redenção universal.35

O terceiro conjunto de material que os estudiosos frequentemente citam como prova para uma estrita “expiação limitada” em Calvino pode ser encontrada em suas explicações sobre 1 Timóteo 2:4.36  Embora interpretando esse versículo (na qual Deus "quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade"), Calvino tenha afirmado que "ninguém a não ser que seja desprovido de senso e juízo pode acreditar que a salvação é ordenada no secreto conselho de Deus igualmente para todos". 37 Como em seus comentários sobre 1 João 2:2, Calvino advertiu contra o uso desse texto para defender aquele universalismo "herético". Calvino respondeu: 

"Quem não vê que a referência [a "todos os homens" em 1 Timóteo 2:4] é para ordens de homens ao invés de homens individuais? Nem, aliás, a distinção carece de fundamento: que o sentido não é de indivíduos das nações, mas nações de indivíduos" 38 

Calvino acrescenta: 

"De qualquer forma, o contexto deixa claro que nenhuma outra vontade é intentada do que aquela que aparece na externa pregação do Evangelho. Assim, Paulo quer dizer que Deus quer a salvação de todos a quem Ele misericordiosamente convida pela pregação de Cristo." 39

Assim Calvino interpreta "todos os homens" em 1 Timóteo 2:4 como uma referência a "ordens" ou "classes" de seres humanos (uma visão comum do "calvinismo de cinco pontos" hoje), mas depois ele correlaciona a passagem à pregação da Palavra, ao invés do "secreto conselho de Deus". Esta visão é confirmada pelo seu comentário sobre 1 Timóteo 2:3-5:

“Pois, embora seja verdade que não devemos tentar decidir qual é a vontade de Deus por espreitar Seu Secreto Conselho, quando Ele a tornou clara para nós por sinais externos, ainda assim isso não significa que Deus não tenha determinado secretamente dentro de Si mesmo o que Ele deseja fazer com cada homem. Mas eu passo por cima desse ponto que não é relevante para o presente contexto, porque o sentido do que apóstolo escreve aqui é simplesmente que nenhuma nação da terra e nenhuma classe social é excluída da salvação, uma vez que Deus quer oferecer o Evangelho a todos, sem exceção".

"Visto que a pregação do Evangelho traz a vida, ele corretamente conclui que Deus considera todos os homens como sendo igualmente dignos de participar da salvação. Mas ele está falando de classes e não de indivíduos e sua única preocupação é a de incluir os príncipes e as nações estrangeiras neste número. . . . Porque, assim como há um só Deus, o Criador e Pai de todos, assim também, ele declara, só há um Mediador, pelo qual o acesso a Deus é aberto a nós, e este mediador não é dado somente para uma nação, ou para alguns homens de uma classe particular, mas a todos, para que os benefícios do sacrifício, pelo qual Ele expiou por nossos pecados, se aplique a todos". 

"Como naquela época uma grande parte do mundo se alienava de Deus, ele menciona explicitamente o Mediador através do qual aqueles que estavam longe, agora são atraídos para perto. O termo universal "todos" deve sempre se referir a classes de homens, mas nunca a indivíduos. É como se ele tivesse dito: 'Não só os judeus, mas também os gregos. Não só as pessoas de classe humilde, mas também os príncipes foram redimidos pela morte de Cristo. " Assim, portanto, Ele pretende que o beneficio de Sua morte seja comum a todos. Aqueles que defendem uma visão que excluiria qualquer um da esperança de salvação faz a Ele uma injúria”. 40

Calvino interpretou "todos os homens" em 1 Timóteo 2:4 como todas as classes "de homens" ao invés de "indivíduos". Mas ele acrescentou que a passagem não diz respeito ao “Secreto Conselho” de Deus (que pertence somente aos eleitos), mas a oferecer a pregação do evangelho "a todos sem exceção." 41  Portanto, Calvino pode mesmo ter entendido "todas as ordens de homens" no sentido de "todos de todas as ordens", e não no sentido (dado por Owen) de "alguns de todas as ordens". 42 

Em todo caso, Calvino não correlaciona 1 Timóteo 2:4  à obra "eficaz" da salvação feita por Deus, mas ao chamado geral da pregação. Portanto, Calvino não associou o verso com o decreto oculto de Deus, mas sim à proclamação do evangelho.43 Como Calvino insistiu, "o contexto deixa claro que nenhuma outra vontade de Deus é intentada do que aquela que aparece na externa pregação do Evangelho." 44 Calvino afirmou que a vontade revelada do "evangelho" ser pregado a todas as classes e ordens de fato era "uma boa notícia".45

O sermão de Calvino sobre 1 Timóteo 2 ecoa essas mesmas idéias (bem como muitos dos temas abordados nas "12 Questões em Calvino sobre a Extensão da Expiação"). O sermão de Calvino se opôs a qualquer "universalismo", que ensinasse que toda a humanidade seria salva no fim.46 O sermão de Calvino apoiou uma oferta geral do Evangelho e destacou a importância do evangelismo.47 Ele aproveitou a oportunidade para reafirmar a escravidão do pecado sobre a qual estão os incrédulos e a necessidade da obra sobrenatural do Espírito.48  A homilia traz instruções com relação a eleição, a fé, e a culpabilidade do incrédulo. Além disso, o sermão de Calvino (aquiescendo ao nosso entendimento finito) distinguiu a “secreta” vontade de Deus e a vontade "revelada" de Deus. 49

Como em outros materiais de Calvino sobre 1 Timóteo 2, o reformador interpretou a frase "Que quer que todos os homens sejam salvos" como uma referência a vontade revelada de Deus na externa pregação do evangelho.50 Ele explicitamente afirmou que o texto não fala do secreto conselho de Deus "nem o que ele quer dizer nos conduz a esta eleição e escolha eterna as quais foram feitas antes do começo do mundo, mas somente nos mostra qual é a vontade e o prazer de Deus, tanto quanto possamos saber." 51 No âmbito desta "vontade revelada," Deus quer que todas as classes, ordens, e povos sejam salvos. 52 

“Em que Deus exorta todos os homens em geral, assim nós podemos julgar, que é a vontade de Deus, que todos os homens sejam salvos, como Ele diz também pelo Profeta Ezequiel [18:23, 33:11]. " 53 "Porque Ele diz que oferece seu evangelho a todos, o qual é o meio para nos atrair para a salvação."54 "Porque nós vemos como Ele chama todos eles, a quem a sua palavra é pregada, para a salvação." 55 

Ainda assim, por causa de nossa pecaminosidade, nós não vamos até Ele:

"Portanto, Deus deve ir além para nos trazer a salvação, Ele deve não somente designar homens e os enviar para nos ensinar fielmente. . . Ele deve nos tocar para o movimento, Ele deve nos atrair a Ele, e deve fazer sua obra não ser inútil a nós, e fazer ela criar raízes em nossos corações"56

Algumas facetas encontradas nas interpretações de Calvino de 1 João 2:2 e 1 Timóteo 2:4 podem ser paralelas às interpretações de muitos dos chamados calvinistas de cinco pontos. Outros detalhes em sua interpretação, no entanto, não. 

Em seu comentário sobre 1 João 2:2, Calvino concedeu que a máxima "Cristo morreu suficientemente por todo o mundo, mas eficientemente somente pelos eleitos” era verdadeira. Naturalmente, ao longo da história, essa máxima tem sido utilizada de maneiras diferentes por vários teólogos.57 Mais curiosamente, Calvino aplicou 1 Timóteo 2:4 a "todas as ordens" ou "todas as classes" de seres humanos, apesar dele ter argumentado que o texto não é sobre o decreto eletivo de Deus, mas sim sobre a proclamação do evangelho. Se Calvin visse 1 Timóteo 2:4 como uma referência à "pregação da Palavra", porque ele se sentiu obrigado a interpretar "todos os homens" como "classes de seres humanos" ao invés de "indivíduos"? 58

Talvez, seguindo as implicações do argumento de Calvino, ele entendeu que nem cada indivíduo pode realmente ouvir o evangelho proclamado, embora o evangelho seja agora pregado a toda nação e classe.59 A confirmação desta interpretação pode ser encontrada em outros comentários de Calvino sobre 1 Timóteo 2:4. Ele observa que, anteriormente no Antigo Testamento, Deus "acendeu a luz da vida somente para os judeus" e "permitiu que os gentios vagassem durante muitos séculos nas trevas (Atos 14:16)". Mesmo no Novo Testamento, o Espírito soberanamente proibiu Paulo de pregar em territórios específicos (Atos 16:6-7). 60 "E assim o Senhor envia o seu Evangelho, onde lhe agrada, e ainda assim sua graça não é derramada somente sobre a Judéia ou somente sobre um canto daquela terra, mas sobre todo o mundo, tanto aqui como acolá, apesar de não ter a mesma disposição em todos os lugares."61

Calvino mantém, então, que nem todos os indivíduos são eleitos no "secreto conselho” de Deus, mas ele parece ainda manter que nem todos os indivíduos são necessariamente destinatários da Palavra pregada no chamado geral do evangelho. Nenhuma dessas duas declarações, no entanto, explicitamente abordam uma terceira questão: se a morte de Cristo foi uma provisão para todos os indivíduos. Este ponto pode parecer estranhamente exigente, até que se considere a chave interpretativa que aparece nos sermões de Calvino sobre Deuteronômio:

"É verdade que São João diz geralmente que Ele amou o mundo. E por quê? Porque Jesus Cristo se oferece a todos os homens, sem exceção, para ser seu Redentor. ....Assim, vemos três graus do amor de Deus, como nos demonstrou em nosso Senhor Jesus Cristo." 

"O primeiro diz respeito ao resgate que foi comprado na pessoa daquele que deu a si mesmo à morte por nós, e se tornou maldito para nos reconciliar com Deus, seu Pai. Esse é o primeiro grau do amor, que se estende a todos os homens, na medida em que Jesus Cristo estende seus braços para chamar e atrair todos os homens, tanto os grandes quanto os pequenos, e ganhá-los para Ele. Mas existe um amor especial por aqueles a quem é o pregado o evangelho, pelo qual Deus testifica a eles que quer fazê-los participantes daquele beneficio que foi comprado para eles pela paixão e morte de Seu filho."

"E tendo em vista que somos desse número, portanto, nós estamos, já, duplamente obrigados a nosso Deus: aqui são dois laços que nos mantem, por assim dizer, ligados a Ele. Agora vamos para o terceiro laço, que depende do terceiro amor que Deus nos demonstra: o qual é que Ele não só faz com que o evangelho seja pregado a nós, mas também nos faz sentir o seu poder, pelo qual [nos faz] não duvidar que nossos pecados foram perdoados por causa do nosso Senhor Jesus Cristo que nos traz a dádiva do Espirito Santo, para nos reformar depois à sua própria imagem.”

Nesta reveladora passagem, Calvino não colapsa a história da salvação no decreto eterno. Deus tem trabalhado diacronicamente o seu eterno desígnio de salvação na história humana, e Calvino distingue três momentos históricos específicos nesta passagem: Primeiro, a redenção comprada por Cristo (que "se estende a todoshomens"). Em segundo lugar, a pregação do evangelho (que é um chamado geral para a humanidade). Terceiro, a formação eficaz da fé por Deus nos eleitos, "Como ele não só faz com que o evangelho seja pregado para nós, mas também nos faz sentir o seu poder.” 

Além disso, pode-se retratar os três "graus de amor" de Calvino, como três círculos concêntricos. No amor, Cristo adquiriu a redenção por "todos os seres humanos", dos quais apenas os em um círculo menor são destinatários do "segundo grau de amor" do chamado geral do evangelho, dos quais os em um círculo ainda menor são destinatários do "terceiro amor" da obra eficaz do Espírito.

Além disso, os três "graus do amor" podem ser distinguidos no tempo. Essa passagem pode fornecer insights sobre a diacrônica e complexa estrutura de Calvino por trás sua visão da eleição, redenção, chamado geral, e chamado eficaz. Na eternidade passada, Deus escolheu os eleitos. Em um evento histórico, Jesus sofreu por toda a humanidade (e para a eficaz salvação dos eleitos). Na história, a provisão universal do sofrimento de Cristo é proclamada por meio do chamado geral do evangelho, que nem todos ouvem.63  Deus ainda trabalha por meio do chamado geral pelo particular e eficaz obra do Espírito apenas entre alguns dos que ouvem (os
eleitos). De acordo com Stephen Strehle, Calvino "argumenta que não é a expiação que produz limitação, nem a pregação do evangelho, mas o Deus que produz a fé em seus poucos eleitos e aplica os benefícios da obra de Cristo a eles somente" 64

Ainda assim, no âmbito mais vasto da teologia de Calvino, esse "terceiro do amor" corresponde também a eterna e incondicional eleição por Deus, desses mesmo indivíduos antes de toda a história humana.

Tais complexidades permitem a Calvino combinar uma forma de "expiação universal" com a "eleição incondicional." E quando os poucos textos convocados como evidências da estrita "expiação limitada" em Calvino (tais como as passagens de 1 João 2 e 1 Timóteo 2) são interpretados dentro da mais ampla e complexa teologia de Calvino, já não podem servir para anular o veredito das suas muitas referências a "ilimitada” provisão da redenção de Cristo.

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Notas:

1. For example, see Leahy, “Calvin and the Extent of the Atonement,” 59–62; Murray, “Calvin on the Extent of the Atonement,” 21–22; cf. Bell, “Calvin and the Extent of the Atonement,” 118–120; Blacketer, “Definite Atonement in His­torical Perspective,” 314–315; Cunningham, Reformers and the Theology of the Reformation, 400. Rainbow adds a fourth passage: Calvin’s John 12:32 (Rainbow, Will of God and the Cross, 65, 177). Yet Calvin interprets the verse as a reference to the efficacious gathering of the elect without drawing an implication concerning the extent of the atonement.

2. Available as “Clear Explanation of Sound Doctrine Concerning the True Partaking of the Flesh and Blood of Christ in the Holy Supper in Order to Dissipate the Mists of Tileman Heshusius,” in Calvin, Tracts and Treatises on the Doctrine and Worship of the Church, vol. 2, trans. Henry Beveridge (Eerdmans: Grand Rapids: 1958), 495–572; also avail­able in Calvin, Theological Treatises, vol. 2, trans. J. K. S. Reid, (Philadelphia: Westminster, 1954), 257–324.

3. Leahy, “Calvin and the Extent of the Atonement,” 61.

4. Boersma, “Calvin and the Extent of the Atonement,” 333.

5. Calvin, Theological Treatises, vol. 2, 285; the Latin is available in Strehle, “Universal Grace and Amyraldianism,” 354n62.

6. Cf. Bell, “Calvin and the Extent of the Atonement,” 119–120: “It is readily seen that throughout this debate, Cal­vin is not discussing the atonement, but rather, the necessity of the presence of the Spirit and faith for the efficacy of the sacrament. He definitely is not making a statement on the exent [sic] of the atonement” (cf. Bell, Calvin and Scottish
Theology, 16–17). This context compels Henri Blocher to “confess a small measure of uncertainty” in using the text as an argument for limited redemption, as he is inclined to do (see Blocher, “Atonement in John Calvin’s Theology,” 280)

7. Rouwendal, “Calvin’s Forgotten Classical Position,” 331.

8. Curt Daniel helpfully compares other instances where Calvin uses the phrase “I should like to know” while engaging in diatribe concerning the Lord’s Supper (in Kendall, Calvin and English Calvin­ism, 233n8).

9. Calvin, “Confession of Faith in Name of the Reformed Churches of France,” 33; idem, Tracts and Treatises on the Doctrine and Worship of the Church, vol. 2, 158.

10. Daniel in Kendall, Calvin and English Calvinism, 234.

11. Rouwendal, “Calvin’s Forgotten Classical Position,” 331.

12. Calvin, Tracts and Treatises on the Doctrine and Worship of the Church, vol. 2, 525.

13. Cf. Calvin’s Mark 14:24: “The word many does not mean a part of the world only, but the whole human race: he contrasts many with one, as if to say that he would not be the Redeemer of one man, but would meet death to deliver many of their cursed guilt. . . . So when we come to the holy table not only should the general idea come to our mind that the world is redeemed by the blood of Christ, but also each should reckon to himself that his own sins are covered” (from Calvin, Harmony of the Gospels, vol. 3, 139; cf. Calvin’s comments on Luke 22:19: “There is no benefit in the crucified flesh itself except for those who eat it by faith” [ibid, 138]). See also Calvin, Matthew 20:28, Harmony of the Gospels, vol. 2, 277, interpreting the phrase “and to give his life a ransom for many”: “‘Many’ is used, not for a definite number, but for a large number, in that He sets Himself over against all others. And this is its meaning also in Rom. 5.15, where Paul is not talking of a part of mankind but of the whole human race.” Cf. Ken­
nedy, Union with Christ and the Extent of the Atonement, 32–33 and 66n41 on Calvin’s understanding of “definite” in this passage.

14. Calvin, “Last Admonition of John Calvin to Joachim Westphal,” Tracts and Treatises on the Doc­trine and Worship of the Church, vol. 2, 425.

15. Calvin, Sermons of M. John Calvin upon the Fifth Book of Moses Called Deuteronomie (London: Middleton, 1583), 1208; English spelling updated.

16. Calvin, “Last Admonition to Joachim Westphal to Joachim Westphal,” in Tracts and Treatises on the Doctrine and Worship of the Church, vol. 2, 481.

17. Calvin, Mark 14:24, Harmony of the Gospels, vol. 3, 139. All of these points (and more) have been made by others. See Daniel, “Hyper Calvinism and John Gill,” 817–823; David Ponter, “John Calvin and Tileman Heshusius,” http://calvinandcalvinism.com/?p=175; Kennedy, Union with Christ and the Extent of the Atonement, 53–56; Stephen L. Costley, “Understanding Calvin’s Argument against Heshusius,” http://calvinandcalvinism.com/?p=215; Costley notes that Calvin did not speak of the “non-elect,” but the “ungodly” or “wicked.” Calvin was referring to unbelievers (some of whom, theoretically, might later become believers, thereby manifesting their election).

18. Peterson, “Calvin on Christ’s Saving Work,” 246. “The Institutes seem to offer little help in deter­mining Calvin’s view. . .. Above all, why does Calvin not even mention the extent of the atonement when he summarizes his views on the person and work of the mediator in the Institutes? . . . In his preface to the reader in the 1559 Institutes, Calvin gives his own methodological statement that one should inter­pret his commentaries doctrinally on the basis of the Institutes” (Peterson, Calvin and the Atonement, 117–120). Calvin himself affirmed that the pattern of his theology was found in the Institutes rather than in his more occasional sermons, commentaries, and treatises (Institutes, preface [“John Calvin to the Reader”], 4–5). Why does Calvin not explicitly emphasize the extent of the atonement in the Institutes? Perhaps because he simply accepted some form of the “medieval synthesis” on the matter as a “given,” and therefore scholarship must focus on continuities and discontinuities between Calvin and the Middle Ages (and his own contemporaries). See the materials being collected by David Ponter at “Calvin on Unlimited Expiation.” 19. Peterson, “Calvin on Christ’s Saving Work,” 246.

20. Calvin, 1 John 2:2, Gospel according to St John 11–21 and the First Epistle of John, 244. See also Calvin, John 10:11.

21. Cf. the doctrine of apokatastasis found in Origen’s writings. Calvin maintained an important distinction: “The benefit of redemption is offered to the ungodly, but not to the devils” (Calvin, Colossians 1:20, Epistles of Paul the Apostle to the Galatians, Ephesians, Philippians and Colossians, 313).

22. Calvin, Concerning the Eternal Predestination, 149.

23. Calvin, Romans 5:18, Epistles of Paul the Apostle to the Romans and to the Thessalonians, 117–118; italics added.

24. Nigel Westhead as found in Clifford, Calvinus, 56. Roger Nicole concedes that Calvin’s com­mentary upon Romans 5:18 “comes perhaps the closest to providing support for Amyraut’s thesis” (see Clifford, “Calvin & Calvinism,” 1). Nicole argued that the passage “may well refer simply to the relevance of the sacrifice of Christ to a universal offer, without actually asserting a substitutionary suffering for all mankind (Nicole, “Moyse Amyraut,” 83n38). A nineteenth-century translator of the passages recorded in a footnote, “It appears from this sentence that Calvin held general redemption” (see Bell, Calvin and Scottish Theology, 34n30). Contrast Helm, Calvin and the Calvinists, 44.

25.Steve Costley, “Did Christ’s Sacrifice Actually Save?” http://controversialcalvinism.blogspot. com.

26. Cf. Calvin, John 17:9.

27. Contrast Kendall, Calvin and English Calvinism, 16n2.

28. See Augustine, “Ten Homilies on the First Epistle General of St. John,” trans. John Burnaby, in, Library of Christian Classics, vol. 8: Augustine: Later Works (London: SCM, 1955), 265–266; cf. Blacketer, “Definite Atonement in Historical Perspective,” 309–310; Thomas, Extent of the Atonement, 32. Blacketer might add Fulgentius of Ruspe to his discussion on page 310. See Francis X. Gumerlock, Fulgentius of Ruspe on the Saving Will of God: The Development of a Sixth-Century African Bishop’s Interpretation of 1 Timothy 2:4 during the Semi-Pelagian Controversy (Lewiston: Edwin Mellen, 2009).

29. Calvin, 1 John 2:2, The Gospel according to St John 11–21 and the First Epistle of John, 244. Else­where, Calvin affirms, “And there was not any sacrifice sufficient to make atonement [reconciliation] be­tween God and the world, but only our Lord Jesus Christ’s offering up of himself” (Calvin, Sermons on Deuteronomy, 107; idem, Sermons of M. John Calvin upon the Fifth Booke of Moses Called Deuteronomie, 660; English spelling updated).

30. See R. Scott Clark’s overview of the doctrines of election and predestination in the Middle Ages (R. Scott Clark, “Election and Predestination: The Sovereign Expressions of God,” in Theological Guide to Calvin’s Institutes: Essays and Analysis, ed. David W. Hall and Peter A. Lillback [Phillipsburg: P & R
Publishing, 2008], 90–96); cf. Rainbow, Will of God and the Cross.

31. See Ponter, “Calvin on Unlimited Expiation.

32. Calvin, John 17:21, The Gospel according to St John 11–21 and the First Epistle of John, 148.

33. See Muller, Christ and the Decree, 34–35: “The Gospel appeal is universal but Christ’s interces­sion, like the divine election, is personal, individual, particular.” Even in his comments upon John 17:9, however, Calvin adds, “And Christ Himself afterwards prayed for all indiscriminately.” He saw this as instructive for believers: “We ought to pray that this and that and every man may be saved and so em­brace the whole human race, because we cannot yet distinguish the elect from the reprobate” (Calvin, John 17:9, The Gospel according to St John 11–21 and the First Epistle of John, 140).

34. Calvin, John 16:33, The Gospel according to St John 11–21 and the First Epistle of John, 133.

35. I thank Tony Byrne for this insight. See Richard A. Muller, “Review of English Hypothetical Uni­versalism: John Preston and the Softening of Reformed Theology, by Jonathan D. Moore,” Calvin Theologi­cal Journal 43 (2008), 149–150; Richard A. Muller, “Revising the Predestination Paradigm: An Alternative to Supralapsarianism, Infralapsarianism, and Hypothetical Universalism” (lecture, Fall Lecture Series, Mid-America Reformed Seminary, November 5–6, 2008).

36. Calvin discusses this Scriptural text in eight places, six of which can be found at http://calvi­nandcalvinism.com/?p=128.

37. Calvin, Concerning the Eternal Predestination, 109.

38. Ibid, 109.

39. Ibid. “Thus, this verse is not to be understood as teaching anything about God’s actual intention
to save certain individuals. Rather, it should be understood only to be dealing with the universal offer of salvation” (Kennedy, Union with Christ and the Extent of the Atonement, 44).

40. Calvin, 1 Timothy 2:4–5, Second Epistle of Paul the Apostle to the Corinthians and the Epistles to Timothy, Titus and Philemon, 208–210.

41. In his Sermons on 1 Timothy 2, Calvin asserts that the apostle is not speaking of specific indi­viduals (such as Peter or Paul) as they relate to God’s secret, eternal decree (Calvin, Sermons of M. John Calvin, on the Epistles of S. Paule to Timothie and Titus, 149). Rather, in Calvin’s interpretation, 1 Timo­thy 2 addresses the external proclamation of the gospel (as the revealed will of God). Therefore, in his comments upon 1 Timothy 2, when Paul emphasized God’s revealed will for “all classes” and “all orders,” he may actually have meant by this not to exclude particular individuals. In his Sermon on 1 Timothy 2, Calvin expressly states, “For Jesus Christ is not a Saviour of three or four, but he offers himself to all” (ibid, 159). Cf. Calvin, Isaiah 53:12. To paraphrase Kennedy, Calvin is using the word “individuals” (sin­guli) for a fixed number of individuals (Kennedy, Union with Christ and the Extent of the Atonement, 46). And (according to Calvin) Paul is not addressing the topic of such particular “individuals” within God’s “secret will”; therefore, “all” is used for “all” of all classes, orders, and peoples, in the “revealed will” of gospel proclamation. In the same manner, according to 1 Timothy 2:1, we are to pray for “all” (Calvin,Sermons of M. John Calvin, on the Epistles of S. Paule to Timothie and Titus, 160; see Steve L. Costley, “Answering Roger Nicole on 1 Timothy 2:5,” http://www.controversialcalvinism.blogspot.com/search/
label/1Timothy%202%3A4–6).

42. Putting together Calvin’s comments on 1 Timothy in Concerning the Eternal Predestination and his Commentaries, Calvin argues that God wills to offer the gospel to “all without exception” (Concerning the Eternal Predestination, 109), but God does not will “all without distinction” to be saved in His hidden eternal counsel ( 1 Timothy 2:4). Such evidence may point to Calvin’s understanding of the Mediator be­ing for all humans of every kind in the revealed will of 1 Timothy 2:4 and 5. Vermigli and Kimedoncius interpreted “all men” in 1 Timothy 2:4 as a reference to some of all kinds, but both were still proponents of “universal redemption.” (I thank David Ponter for this insight.)

43. In this manner, Calvin differed from the Augustinian interpretation of 1 Timothy 2:4, which tied the “all kinds” or “all classes” into the hidden will of God in His eternal decree (see Ponter, “Brief His­tory of Deviant Calvinism,” 18).

44. Calvin, Concerning the Eternal Predestination, 109. “This verse does not mean to teach that all will be saved, rather, this verse deals with God’s revealed will only. Calvin’s only intent in this passage is to make clear that the Scriptures do not teach that all will be saved” (Kennedy, Union with Christ and the Extent of the Atonement, 47).

45. See Rainbow, Will of God and the Cross, 142.

46. “That God would have all the world to be saved: to the end that as much as lies in us, we should also seek their salvation” (ibid, 148; English updated).

47. “Therefore Saint Paul’s meaning is not that God will save every particular man, but he says that the promises which were given to one only people [the Jews], are now stretched out through all the world” (Calvin, Sermons of M. John Calvin, on the Epistles of S. Paule to Timothie and Titus, 149; English spelling updated).

48. “And can we come to him of the motion of our own nature? Alas no: for we are wholly against him, and there is not one iota of affection in us, but it is his utter enemy, as St. Paul says, and we do daily rebel against him” (ibid, 159; English spelling updated). “But we are all of us so contrary and such enemies to God. . . . So then, how can it be that we may be partakers of that salvation which is offered unto us in the Gospel, unless God draw us to it by his Holy Spirit?” (ibid, 151; English spelling updated).

49. “Truth it is, that God changes not, neither has he two wills, neither does he use any counterfeit dealing, as though he meant one thing, but would not have it so. And yet does the Scripture speak unto us after two sorts touching the will of God. . . . It is because of our grossness and rudeness: for we know, that if God will come down to us, and give us any understanding of things, he must change his own hue” (ibid, 152; English spelling updated). Just as our eyes cannot bear to look directly at the sun, so our minds cannot “comprehend that infinite majesty which is in God” (ibid, 156; English spelling updated). “So then these beasts, which would destroy God’s election, must not abuse this place, nor say, that we make a double will in God: for therein they do impudently and villainously misreport us. But we say as every man sees, that is to wit, that as far as we can perceive, God would have all men to be saved, whenever and how oft ever he appoints his Gospel to be preached unto us” (ibid, 156; English spelling updated).

50. “If through the will of God the Gospel be preached to all the world, there is a token that salva­tion is common to all. And thus Saint Paul proves, that God’s will is that all men should be saved” (ibid, 150; English spelling updated).

51. Ibid, 152; English spelling updated.

52. Calvin connects God’s desire for all to be saved with the next phrase in 1 Timothy 4 as the means to the end (“and to come unto the knowledge of the truth”). “Thus the Scripture holds us in this simplic­ity, that if we desire to have salvation, we must hold the mean which is appointed for us, and which God sets before us, that is to say, we must receive his word with obedience of faith” (ibid, 159; English spell­ing updated).

53. Ibid, 154; English spelling updated.

54. Ibid, 156; English spelling updated.

55. Ibid, 158; English spelling updated.

56. Ibid, 156; English spelling updated.

57. See Godfrey, “Reformed Thought on the Extent of the Atonement,” 133–171.

58. “It is indeed a strange fact that Calvin sometimes interpreted ‘many’ as ‘all,’ and sometimes he interpreted ‘all’ as ‘many’” (Rouwendal, “Calvin’s Forgotten Classical Position,” 332). Thomas concurs that “Calvin bewilderingly takes ‘all’ to mean ‘some’ in some places dealing with the atonement, and ‘some’ to mean ‘all’ in others where the context is similar” (Thomas, “Calvin and English Calvinism,” 118). See Calvin’s comments on Mark 14:24 above. In John 6:45, Calvin notes that “all” must be “limited to the elect” (“and they shall be all taught of God”). Cf. Calvin, Matthew 20:28, where he explicitly reiter-ates that “many” refers to “all,” not a part of humanity but the whole human race. “Yet I approve of the ordinary reading, that he alone bore the punishment of many, because on him was laid the guilt of the whole world. It is evident from other passages, and especially from the fifth chapter of the Epistle to the Romans, that ‘many’ sometimes denotes ‘all’” (Calvin, the Book of the Prophet Isaiah, vol. 4, 131). “To bear the sins means to free those who have sinned from their guilt by his satisfaction. He says many meaning all, as in Rom. 5.15. It is of course certain that not all enjoy the fruits of Christ’s death, but this happens because their unbelief hinders them” (Hebrews 9:28, Epistle of Paul the Apostle to the Hebrews and the First and Second Epistles of St Peter, 131). In his comments on Hebrews 5:9, Calvin explains, “At the same time he has inserted the universal term ‘to all’ to show that no one is excluded from this salvation who proves to be attentive and obedient to the Gospel of Christ” (ibid, 67). See Kennedy, Union with Christ and the Extent of the Atonement, 32–35. 59. An arguable point, considering Calvin’s specific sixteenth-century context, but see Revelation 5:9 and 10.

60. Calvin, Concerning the Eternal Predestination, 108; cf. Calvin, Sermons of M. John Calvin, on the Epistles of S. Paule to Timothie and Titus, 152, 157. See also Calvin’s preface to Olivetan’s French New Testament; Titus 2:11. Cf. some Lutheran attempts to posit a universal gospel proclamation to all humans before Christ (Kuiper, For Whom Did Christ Die? 84).

61. Calvin, Sermons of M. John Calvin, on the Epistles of S. Paule to Timothie and Titus, 157; English spelling updated. 

62. Calvin, Sermons on Deuteronomy, 167. In personal correspondence, Alan Clifford has highlighted further materials from Calvin’s Sermons on Deuteronomy. According to Calvin, God calls “the world to salvation” (181.a.40), and behind such a universal call is the fact that “Jesus Christ went out of the citie Jerusalem, bearing the reproach and curse of the whole world upon him” (30.a.40). “Let us mark then that here is no exception, and that God’s intent is to bring all the world to his lure” (661.a.40). Such texts concern the revealed will of the gospel proclamation (and its accompanying provision) rather than the decree of predestination.

63. This is one reason why one’s perspective cannot be based upon human views of “fairness.” In both Calvinistic and Arminian views (traditionally, at least), not all human beings receive equal oppor­tunity to hear the gospel. Attempts to establish “egalitarian” fairness have sometimes led to the espousing of postmortem opportunities to hear the gospel. See Clark H. Pinnock, A Wideness in God’s Mercy: The Finality of Jesus Christ in a World of Religions (Grand Rapids: Zondervan, 1992); Gabriel Fackre, “Divine Perseverance,” in What About Those Who Have Never Heard? ed. John Sanders (Downers Grove: Inter­Varsity, 1995), 71–95.

64. Strehle, “Universal Grace and Amyraldianism,” 354n62. See also idem, “The Extent of the Atone­ment within the Theological Systems of the Sixteenth and Seventeenth Centuries” (ThD diss., Dallas Theological Seminary, 1980); idem, “The Extent of the Atonement and the Synod of Dort,” Westminster Theological Journal 51 (1989): 1–23. As Helm notes, “At some point in Calvin’s system, and in the systemof any Calvinist, the scope of election and of the application of redemption must coincide” (Helm, “Calvin, English Calvinism,” 182).



Fonte: http://www.baptistbulletin.org/wp-content/uploads/2009/07/a-word-for-the-world.pdf
Tradutor:  Emerson Campos Pinheiro

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