segunda-feira, 6 de setembro de 2010

João Calvino (1509-1564): O Espírito Convence os Réprobos do Pecado - Comentário sobre João 16:8

“Quando Ele vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo”


8. “E quando Ele vier”. Passando pela diversidade de exposições, que temos recebido em consequência da obscuridade da passagem, eu somente declararei o que me parece estar em conformidade com o verdadeiro sentido pretendido por Cristo. Ele prometeu Seu Espírito aos discípulos, e agora ele enaltece a excelência do dom a partir de seus efeitos, porque este Espírito não só os guiará, sustentará e protegerá em particular, mas estenderá mais amplamente seu poder e eficácia.


“Ele convencerá o mundo”, ou seja, Ele não permanecerá preso em vocês, mas o Seu poder sairá de vocês para ser exibido para todo o mundo. Ele, portanto, promete-lhes um Espírito, que será o Juiz do mundo, e por quem sua pregação será tão poderosa e eficaz, que trará em sujeição os que anteriormente se satisfaziam em licenciosidades sem limites, e foram restringidos não por medo ou reverência.

Deve ser observado que nesta passagem Cristo não fala de revelações secretas, mas do poder do Espírito, o qual aparece na externa doutrina do Evangelho, e na voz dos homens. Pois como se explica que a voz que procede da boca de um homem penetre no coração, lance raizes e depois de um tempo gere frutos, mudando corações de pedra em corações de carne, e renovando os homens, a não ser pelo Espirito de Cristo que os vivifica?

Caso contrário ela seria letra morta e um som inútil, como Paulo diz naquela bela passagem, na qual se orgulha de ser um ministro do Espírito (2 Coríntios 3:06), porque Deus operou poderosamente em sua doutrina. O significado, portanto, é que, embora o Espírito tenha sido dado aos apóstolos, eles seriam dotados de um poder divino e celestial, pelo qual eles teriam jurisdição sobre todo o mundo. Agora, isso é atribuído mais ao Espírito do que a eles mesmos, porque eles não teriam nenhum poder próprio, mas seriam apenas ministros e instrumentos, e o Espírito Santo seria seu diretor e governador.

Sob o termo “mundo” são, creio eu, incluídos não só aqueles que seriam verdadeiramente convertidos a Cristo, mas também hipócritas e réprobos. Pois existem duas maneiras pelas quais o Espírito convence os homens pela pregação do Evangelho. Alguns são movidos em boa sinceridade, de modo que se curvam desejosamente, e consentem desejosamente ao juízo pelo qual eles são condenados. Outros, porém são convencidos da culpa e não podem escapar, mas não se entregam realmente, ou se submetem à autoridade e jurisdição do Espírito Santo, mas, pelo contrário, sendo subjugados eles gemem interiormente, e sendo sobrecarregados com a ruína, ainda assim não cessam de acalentar obstinação nos seus corações.

Nós agora percebemos de que maneira o Espírito ia convencer o mundo pelos apóstolos. Foi devido a Deus ter revelado o Seu juízo no Evangelho, pelo qual suas consciências foram atingidas, e começaram a perceber seus males e a graça de Deus. Porque o verbo eije>gcein aqui significa convencer ou condenar, e, para compreender essa passagem, muita luz é obtida a partir das palavras do apóstolo Paulo, quando ele diz:

“Se todos profetizarem, e entrar algum incrédulo ou indouto, é ele por todos convencido e por todos julgado e assim se tornam lhe manifestos os segredos do coração” (I Cor 14:24)

Nessa passagem, Paulo fala particularmente de um tipo de convicção, ou seja, quando o Senhor traz os seus eleitos ao arrependimento pelo Evangelho, mas isso mostra claramente de que maneira o Espírito de Deus, pelo som da voz humana, constrange os homens, que anteriormente não estavam acostumados ao seu jugo, a reconhecer e se submeter à Sua autoridade.

A questão que agora se coloca é qual o propósito de Cristo ter dito isso? Alguns pensam que ele especifica a causa do ódio que Ele tinha mencionado, como se tivesse dito que o motivo pelo qual eles vão ser odiados pelo mundo, é que o Espírito, por outro lado, vai seriamente buscar persuadir o mundo por meio deles. Mas prefiro concordar com aqueles que nos dizem que o designio de Cristo era diferente, como eu disse brevemente no início da exposição deste versículo, pois foi de grande importância que os apóstolos soubessem que o dom do Espírito, que havia sido prometido a eles, era extremamente valioso. Ele descreve, portanto, sua excelência incomum, dizendo que Deus, desta forma, erguerá Seu tribunal para julgar o mundo todo.




Fonte: http://www.biblestudyguide.org/comment/calvin/comm_vol35/htm/vi.ii.htm
Tradutor:  Emerson Campos Pinheiro