sábado, 28 de agosto de 2010

Zacarias Ursino(1534–1583): A Morte de Cristo no Comentário sobre o Catecismo de Heidelberg

Trechos Selecionados

Pecados do mundo e frases cognatas:

1) 2. Era necessário que o resgate a ser pago pelo Redentor fosse de valor infinito, para que pudesse possuir dignidade e mérito suficiente para a redenção das nossas almas, e para que pudesse se recorrer a ele no julgamento de Deus, com o propósito da expiação dos nossos pecados e da restauração em nós daquela justiça e vida que tínhamos perdido. Por isso convinha que a pessoa que faria essa satisfação por nós, fosse dotado de infinita dignidade, isto é, que fosse Deus. Porque a dignidade da satisfação, por conta daquilo que poderia ser aceitável diante de Deus e de valor infinito, embora temporal, consiste em duas coisas: na dignidade da pessoa e na grandeza da punição. 


A dignidade da pessoa que sofreu aparece nisto: que essa pessoa era Deus, o próprio Criador, que morreu pelos pecados do mundo. Morte esta que é infinitamente superior a destruição de todas as criaturas, e mais benéfica do que a santidade de todos os anjos e homens. Por isso é que os Apóstolos, quando falam dos sofrimentos de Cristo, quase sempre fazem menção de sua divindade. "Deus comprou a Igreja com seu sangue." "O sangue de Jesus Cristo nos purifica de todo pecado." Eis o Cordeiro de Deus, que tira os pecados do mundo." Sim, o próprio Deus, no Paraíso, participou dessas duas coisas: "A semente da mulher te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar. "(Atos 20:28. 1 João I: 7. João 1:29. Gen. 3:15).

A grandeza da punição a qual Cristo suportou aparece nisto: que Ele suportou os terríveis tormentos do inferno e a ira de Deus contra os pecados do mundo inteiro. "Angústias do inferno se apoderaram de mim." "Deus é um fogo consumidor." "O Senhor fez cair sobre ele a iniqüidade de todos nós." (Sl .116: 3. Deut. 4:24. Is.53:10.) A partir disso podemos perceber por qual razão foi que Cristo manifestou sinais de angústia na perspectiva da morte, embora muitos dos mártires encontraram a morte com grande coragem e serenidade. [P., 88.] 

2) Ou, podemos, em conformidade com as questões 18, 19 e 20 do Catecismo, definir o evangelho como sendo a doutrina que Deus revelou primeiro no Paraíso, e posteriormente foi proclamada pelos Patriarcas e pelos Profetas, que se agradou em representar por sombras de sacrifícios, e outras cerimônias da lei, e que Ele tem concluido pelo seu Filho unigênito; o ensino de que o Filho de Deus, nosso Senhor Jesus Cristo, é feito para nós sabedoria, justiça, santificação e redenção , o que equivale a dizer que Ele é um mediador perfeito, satisfazendo os pecados da raça humana, restaurando a justiça e a vida eterna a todos aqueles que por uma verdadeira fé são enxertados nele, e abraçam seus benefícios. [P., 102.]

3) Q20. Todos os homens, então, tornam-se salvos por Cristo, assim como pereceram em Adão? 

R. Não, somente aqueles enxertados nele, e que recebem todos seus benefícios pela fé verdadeira.

Depois de ter explicado o modo de nossa libertação através de Cristo, devemos agora inquirir cuidadosamente quem é feito participante desta libertação, e de que forma é efetuada; se todos ou apenas alguns são feitos participantes da mesma. Se ninguém é feito participante dela, então ela foi realizada em vão. Esta vigésima pergunta é, portanto, preparatória para a doutrina da fé, sem a qual nem o mediador, nem a pregação do evangelho, seriam de qualquer vantagem. Ao mesmo tempo que oferece um remédio contra a insegurança carnal, e fornece uma resposta para aquela calúnia que faz de Cristo o ministro do pecado.

A resposta a esta pergunta é composta de duas partes: a salvação através de Cristo não é concedida a todos os que pereceram em Adão, mas apenas sobre aqueles que, por uma verdadeira fé, são enxertados em Cristo, e recebem todos os seus benefícios. 

A primeira parte desta resposta é claramente comprovada pela experiência, e pela Palavra de Deus. "aquele que não crê no Filho não verá a vida; mas a ira de Deus sobre ele permanece." " Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus. "Aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus. "(João 3:36; 3:3; Mat. 7:21). A razão pela qual nem todos são salvos por Cristo, não é devido a qualquer insuficiência de mérito e graça Nele – porque a expiação de Cristo é pelos pecados de todo o mundo, com respeito a dignidade e a suficiência da satisfação que ele fez, mas surge da incredulidade - porque os homens rejeitam os benefícios de Cristo oferecidos no Evangelho, e assim perecem por sua própria culpa, e não por causa de qualquer insuficiência nos méritos de Cristo. 

A outra parte da resposta é igualmente evidente a partir das Escrituras. "Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus" "Pelo seu conhecimento o meu servo justo justificará a muitos. "(João 1: 12. Is. 53: 11.) A razão pela qual apenas os que creem que são salvos, é porque somente eles se apoderam e abraçam os benefícios de Cristo, e porque somente neles Deus assegura o fim para o qual Ele entregou graciosamente o seu Filho à morte; pois somente aqueles que crêem conhecem a misericórdia e a graça de Deus, e retornam o adequado agradecimento a Ele.

A soma de toda essa questão é, portanto, esta: embora a satisfação de Cristo, o mediador pelos nossos pecados, seja perfeita, ainda assim nem todos obtêm a libertação por ela, mas somente aqueles que crêem no evangelho, e aplicam a si mesmos os méritos de Cristo por meio de uma fé verdadeira. [P., 106.]

4) Obj. 2. Todos esses devem ser recebidos em seu favor porque por essas ofensas uma satisfação suficiente foi feita. Cristo fez uma satisfação suficiente para as ofensas de todos os homens. Portanto, todos devem ser recebidos no seu favor, e se isso não for feito, Deus é injusto para com os homens, ou então há algo diminuido do mérito de Cristo.

Resposta:  Isso é verdade, a menos que alguma condição seja adicionada a satisfação; como que somente aqueles que, pela fé, aplicam a satisfação a si mesmos são salvos por ela. Mas esta condição é expressamente acrescentada, onde é dito: "Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna." (João 3: 16.) [p., 107. ].

5)Há, portanto, quatro principais partes do oficio sacerdotal de Cristo:

1. Ensinar aos homens, e isso de uma maneira diferente de todos os outros, que são chamados a agir como sacerdotes; porque ele não meramente fala ao ouvido pela sua palavra, mas eficazmente inclina os corações pelo Seu Espírito Santo.

2. Oferecer a Si mesmo como um sacrificio pelos pecados do mundo.

3. Fazer contínua intercessão e oração por nós ao Pai, para que Ele possa nos receber em seu favor por causa de sua intercessão e vontade, e por causa da perpétua eficácia desse sacrificio; e de ter a promessa de ser ouvido com relação àquelas coisas as quais ele pede.

4. Aplicar esse sacrificio sobre aqueles por quem ele intercede, que é receber em favor aqueles que crêem, trazendo isso diante do Pai para que possa recebê-los, e para que a fé possa ser construida em seus corações, por meio da qual os méritos de Cristo possam ser feitos sobre eles, de forma que sejam regenerados pelo Espírito Santo para a vida eterna. [p. 175]

Fonte: http://calvinandcalvinism.com/archives/19
Tradução:  Emerson Campos Pinheiro.